O
Retiro da Ti Jaquina faz parte da memória das casas de pasto dos
arredores saloios, onde se cantava o fado. A sua história está
ligada à história da terra e dos seus habitantes.
Era
uma das casas de pasto mais antigas da Calçada de Carriche, situada
à entrada de Olival Basto. Abriu portas no início do século XX e
encerrou no final dos anos quarenta.
Como se pode ler no Boletim Olisipo dos “Amigos de Lisboa” (1942) «as casas do Campo Grande e da Calçada de Carriche, … que se prolongavam com as do Senhor Roubado e de Odivelas, terra dos esquecidos e da marmelada, hoje representados pela Tia Joaquina, locanda que se abre à direita do caminho de Loures, numa casa saloia…».
Eugénio do Espírito Santo, na sua obra “Ameixoeira um Núcleo Histórico” (1997), faz uma descrição das portas de Carriche e da entrada na cidade de Lisboa, com uma referência à Estalagem da Tia Joaquina: «As carroças e outros transportes que entravam pelas portas de Carriche a caminho da cidade, estacionavam ali perto, quando chegavam de madrugada, na “Ti Joaquina” e no “Café dos Bodes” e aguardavam pela abertura do portão para a ação fiscalizadora da mercadoria, que era feita pelos chamados Pica Chouriços, como os alcunhou o povo.
Vinham dos campos dos lados de Loures, Bucelas, Odivelas, Caneças e Montemor, com as suas carroças carregadas de produtos hortícolas em especial e tinham obrigatoriamente que parar pela “barreira” fiscalizadora e pagar o chamado imposto de consumo.»
Entre
as muitas histórias que se contam sobre o Retiro da Tia Joaquina, há
uma fantástica, que está associada aos primórdios da atividade da empresa de
transportes Barraqueiro, (fundada em 1914) e que é relatada numa
homenagem a Miguel Jerónimo: “O BARRAQUEIRO” (1892 1982), em
http://www.mafraregional.pt
(Imagem
retirada de http://bibesjcp.no.sapo.pt/historiadotransporte.htm
)
«A
concorrência era grande e as coisas iam de mal a pior. Quando Miguel
toma conta da empresa depara com os passageiros habituais a mudar
para os colegas de Torres Vedras sem ele saber porquê, mas não
tardou que descobrisse.
Os torreenses ofereciam uma cigarrilha a todos os passageiros logo que entravam nas camionetas. Mal punham o pé lá dentro, cigarrilha na mão. Naquele tempo as mulheres não fumavam, se não a coisa era diferente!... Assim, o chamariz era só para os homens que se consolavam a fumar e as passageiras viajavam desconsoladas.
O Miguel Barraqueiro via as camionetas de Torres passar para Lisboa apinhadas e as suas vazias, e já dizia mal à sua vida, quando lhe ocorre uma genial ideia para responder à concorrência satisfazendo os passageiros e ao mesmo tempo consolar as mulheres.
Se a concorrência oferecia cigarrilhas, ele respondeu com charutos (…) A tática do charuto resultou em cheio, com as camionetas do Barraqueiro abarrotadas de passageiros a fumar charuto, ficando as outras empresas a chuchar no dedo. E para consolar as passageiras que agora se viam mais discriminadas, o patrão Miguel ordena aos seus motoristas que parassem à entrada do Olival Basto, junto à estalagem da Ti Jaquina, ou um pouco mais adiante na tasca do Jorge, para ali oferecer às mulheres um cafezinho quente.»
Os habitantes mais velhos do Olival Basto ainda se lembram do Retiro da Tia Joaquina e dos seus proprietários, que eram a Tia Joaquina e o Ti Xico. Nesta casa de pasto, onde se cruzavam os saloios a caminho da cidade e os alfacinhas que procuravam fora de portas, os prazeres do campo, havia bons petiscos e fados e guitarradas até de madrugada.
Esta era a imagem do edifício, já bastante degradado, nos finais dos anos sessenta do século XX.
Para
manter a tradição, em 1949, o “Retiro da Tia Joaquina” foi
completamente remodelado e deu lugar a uma outra casa de fados, o
“Restaurante Regional Patrício”.
Um anúncio, publicado no jornal Diário de Lisboa de 31/12/1949, confirma a mudança.
Filomena Viegas
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